A Europa Precisa de um Churchill
A Europa precisa de um Churchill, mas Churchill está morto e
os que restam são meros funcionários de uma engrenagem sem alma, engravatados
que sorriem para as câmaras, gesticulam em cimeiras, assinam papéis e regressam
a casa convencidos de que fizeram algo de útil. A guerra, essa, continua. Os
mísseis continuam a cair sobre Kiev como se fossem inevitáveis, como se
fizessem parte do calendário. Quarta-feira chove, quinta-feira bombardeamentos,
sexta-feira mais uma reunião do Conselho Europeu onde se repete que a Ucrânia
não será abandonada, que o apoio é firme, inquebrantável, sólido, como se as
palavras parassem tanques, como se o inimigo recuasse perante frases bem
redigidas e comunicados oficiais.
Putin observa e espera. Sabe que a Europa é um organismo
doente, de músculos atrofiados, acostumado a uma paz artificial onde os
conflitos eram coisas de outros continentes, problemas distantes que se
resolviam com sanções simbólicas, notas de protesto, alguma indignação
protocolar. Mas agora a guerra está aqui, não nas televisões, não nos livros de
História, aqui, do outro lado da fronteira, e os políticos fazem contas,
calculam riscos, ponderam vantagens e desvantagens, como se a liberdade fosse
um exercício de contabilidade. E enquanto hesitam, morrem pessoas. Enquanto
adiam, um exército avança. Enquanto discutem percentagens do PIB em reuniões
tecnocráticas, a Ucrânia sangra.
Churchill nunca hesitou. Churchill, que olhou para o
desespero e viu uma razão para lutar, que percebeu que certas guerras não são
uma questão de escolha, mas de sobrevivência, que compreendeu haver momentos em
que só existem duas opções: resistir ou desaparecer. Mas Churchill não está
aqui. No seu lugar, temos burocratas a fazer discursos sobre “autonomia
estratégica”, políticos que não querem “provocar” demasiado Moscovo, líderes
que torcem para que a Ucrânia resolva o problema sozinha porque, na verdade,
preferiam que o problema não existisse. Mas o problema existe. E Putin continua
a olhar para Kiev como Hitler olhou para Praga, com aquele misto de desprezo e
paciência, sabendo que do outro lado, ninguém quer verdadeiramente lutar, que acabará
no fim por levar o que quer porque os outros, no fundo, querem somente que tudo
isto acabe, de qualquer maneira, a qualquer preço.
Trump assiste de longe, entretido com os seus próprios
delírios, e a Europa deveria perceber que está sozinha. Mas a Europa não
percebe. A Europa assobia para o lado, olha para os sapatos, adia decisões,
finge que tudo pode ser resolvido com negociações, como se a História não
tivesse ensinado nada, como se Hitler não tivesse existido, como se Chamberlain
não tivesse regressado de Munique a acenar com um pedaço de papel que, semanas
depois, já não valia nada.
A Europa precisa de um Churchill. Alguém que se levante, que
bata com o punho na mesa, que diga aquilo que ninguém quer ouvir: que Putin só
entende a força, que Trump é uma ameaça tanto quanto ele, que há batalhas que
não podem ser evitadas sem consequências ainda piores. Mas Churchill morreu, e
os que ficaram limitam-se a olhar uns para os outros, à espera de que alguém
resolva o problema por eles.
A Europa precisa de um Churchill que diga, alto e bom som: “we
shall never surrender!”
Fevereiro 2025
Nuno Morna
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