O candidato de Schrödinger.

[Entre o cartaz e o caixão, uma ETAR e um talvez]


O PSD-M, sempre criativo na arte de não decidir ou de decidir mal, acaba de apresentar ao Funchal, e, por extensão, à Madeira inteira, uma nova categoria da zoologia política: o candidato de Schrödinger. Aquele que é e não é ao mesmo tempo. Que está numa lista, mas fora dela. Que concede entrevistas, mas desmente a própria existência eleitoral. Um candidato que respira, fala, aparece na imprensa, mas jura que talvez esteja morto antes do primeiro panfleto.


José Luís Nunes é um médico de respeito e respeitável, figura pública com alguma compostura, alguém que se deu ao trabalho de preservar a seriedade da vida pública como quem limpa as janelas de uma casa abandonada. E, no entanto, aqui está ele, sujeito à humilhação calculada de uma pré-candidatura sem convicção, feita à imagem do partido que o rodeia: desfeito, hesitante, mais preocupado com arranjos internos do que com qualquer ideia de cidade, projecto ou comunidade.


O cenário escolhido para a declamação da dúvida foi, como não podia deixar de ser, uma ETAR. A política, especialmente a local, tem esta estranha atracção pela simbologia fétida. E foi nesse lugar, apropriado, quase providencial, que Nunes anunciou ao mundo que “não é o candidato definitivo à Câmara do Funchal”. Traduzido: é o candidato se não aparecer outro. Ou se não o mandarem calar. Ou se o partido não implodir de vez antes do fim do verão.


Esta comédia de mau gosto, que se vai repetindo ciclo após ciclo, retrata com exactidão a decadência do PSD regional. Já não se escolhem candidatos por ideias, mérito ou coragem. Escolhem-se por exclusão de partes, por conveniência de calendário ou porque estavam na sala certa quando alguém se lembrou de fazer uma lista. E depois sujeitam-se, como José Luís Nunes, a esta dança de indecisão pública, onde o estatuto é tão líquido quanto a credibilidade que ainda resta.


José Luís Nunes, justamente por ser quem é, devia ter mais orgulho. Devia saber que estas coisas, uma vez aceites, colam para sempre. Que ninguém respeita um homem que não sabe se quer o lugar que o partido lhe empurrou para as mãos. Que os eleitores, mesmo os mais distraídos, pressentem a hesitação como se fosse mau cheiro. E que nenhum projecto sério começa com um “talvez” dito à porta de uma ETAR.


Estamos, pois, perante um candidato que só existe por hipótese. Um candidato quanticamente indefinido, cuja função de onda eleitoral colapsará algures entre o verão e o fim do prazo para entrega de listas. E, como na famosa experiência de Schrödinger, só saberemos se está vivo ou morto quando se abrir a caixa. Até lá, o PSD-M continuará a fingir que tudo está sob controlo. E o Funchal continuará à espera de um candidato que queira, efectivamente, sê-lo.


Junho 2025

Nuno Morna 



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