Desleixo Fitossanitário
É absolutamente escandaloso, senão criminoso, que na Madeira, terra de um ecossistema único e frágil, se permita a entrada e comercialização de madeira infestada por insectos, trazida da China, sem que as autoridades responsáveis levantem um dedo até ao momento em que o problema já se encontra exposto nas prateleiras de uma grande superfície. Onde está a fiscalização? Onde está a responsabilidade? Onde está o brio que deveria guiar a acção pública nesta Região?
A Madeira não é apenas um pedaço de terra com belas paisagens. É um tesouro natural, um enclave de biodiversidade irrepetível que, ao longo dos séculos, foi alvo de sucessivas ameaças externas – sempre enfrentadas com desleixo e, diga-se, com uma dose considerável de ignorância. Agora, descobrimos que madeira e bambu infestados – infestados ao ponto de estar ocos e cobertos de farelo – chegaram, não só à ilha, mas aos escaparates, sem que ninguém reparasse ou actuasse antes do dano estar feito. É uma vergonha.
A nota de imprensa do Instituto das Florestas e Conservação da Natureza (IFCN), para cúmulo, é um exercício de cinismo burocrático. Louva-se a “postura colaborativa” da empresa responsável pela venda, como se retirar do mercado materiais infestados fosse uma forma de magnanimidade empresarial e não, pura e simplesmente, o cumprimento de um dever básico. A empresa “prontificou-se” a cooperar? Não, senhores. A empresa devia ser responsabilizada, exemplarmente, por negligência e desrespeito pelo património natural da Região.
O IFCN, por sua vez, aproveita o momento para emitir recomendações vazias, apelando ao “rigor” dos importadores. Rigor, senhores? O rigor cabe às autoridades, que têm a obrigação de vigiar, de fiscalizar e de impedir que materiais de origem biológica contaminados entrem na Madeira. Qualquer outra abordagem é um convite à catástrofe. Não se trata de um simples incidente administrativo, mas de uma potencial tragédia ecológica. Já vimos o que pragas introduzidas podem fazer às florestas e às culturas. Será que ninguém aprendeu nada com o passado?
Não basta destruir o material apreendido, embora isso seja, evidentemente, o mínimo. É preciso apurar responsabilidades – e punir exemplarmente quem falhou. Importadores que trazem materiais contaminados para a Região, superfícies comerciais que os colocam à venda sem qualquer controlo, e, acima de tudo, as autoridades que deixam que estes erros aconteçam devem ser responsabilizados. A Madeira não pode ser tratada como um armazém desordenado, onde entra tudo, venha de onde vier.
A verdade, tristemente, é que este episódio revela o habitual amadorismo da gestão pública na Madeira. Vive-se de improvisos, apela-se à boa vontade dos prevaricadores, elogia-se a “colaboração” daqueles que apenas tentam salvar a face. E enquanto isso, o ecossistema insubstituível da Madeira fica, mais uma vez, exposto à devastação. Não admira que os madeirenses, há muito, se tenham resignado a este estado de coisas. Afinal, quem se importa?
Dezembro 2024
Nuno Morna
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