O Labirinto do Despesismo: A Ilusão Orçamental da Madeira

O Boletim de Execução Orçamental da Madeira, referente ao mês de Dezembro, ontem divulgado, uma edição cuidadosamente ornamentada com números grandiosos e percentagens ofuscantes, é uma peça exemplar de engenharia política e económica que esconde, sob o verniz técnico, uma administração regional capturada pelo imobilismo e pelo desperdício. Estamos perante um documento que celebra o triunfalismo orçamental, mas que, ao olhar mais atento, revela-se um conto de servidão fiscal e dependência política.

Comecemos pela receita. Aumentos de impostos directos e indirectos, festejados como sinais de eficiência arrecadatória, não são senão uma confissão de fracasso. É a eterna fuga para a frente: espremer ainda mais os cidadãos e empresas para financiar um aparelho estatal inchado, que não conhece limites. Impostos como o IRC e o IVA crescem, não porque a economia esteja florescente, mas porque o fisco se tornou um parasita mais eficaz, sugando o que resta de vitalidade na economia local. E as transferências correntes da Administração Central? Um lembrete humilhante de que a Madeira não é auto-suficiente, mas um satélite fiscal de Lisboa, dependente da esmola orçamental para sobreviver.

E as despesas? Aqui o espectáculo torna-se quase cómico. O boletim gaba-se de uma subida de 11,3% nas despesas correntes, como se o crescimento do consumo público fosse um acto de virtude. A Madeira, tal como o resto do país, continua a gastar como se fosse um principado rico, distribuindo salários, benefícios e subsídios sem nenhum escrutínio sério sobre a sua eficácia ou impacto. Saúde e educação recebem a fatia de leão, mas onde está a prova de que o dinheiro é bem gasto? Serviços de saúde em colapso e um sistema educacional que mal prepara os jovens para o mercado de trabalho são os tristes frutos desta generosidade fiscal.

A dívida é outro ponto de absurdo. Refinanciar compromissos e acumular encargos financeiros crescentes – um aumento de 17,6% em juros e outros encargos – é tratado com a naturalidade de quem aceita um destino trágico. Mas este destino não é inevitável: é uma escolha deliberada de governos que recusam reformar-se e que, no fundo, preferem transferir os custos da sua incompetência para as gerações futuras. Afinal, é sempre mais fácil comprar tempo com empréstimos do que confrontar os sindicatos, os interesses instalados e a burocracia que perpetua este sistema.

E o que dizer da sustentabilidade fiscal? Qual sustentabilidade? Um saldo primário positivo não é um feito de gestão brilhante, mas o mínimo esperado de qualquer governo que não tenha a audácia de gastar mais do que arrecada. Mas mesmo esse saldo é insuficiente para mascarar a fragilidade estrutural de um modelo que depende de transferências externas e que ignora o sector privado, relegado ao papel de mero contribuinte passivo.

O que o boletim evita dizer, com a sua linguagem anódina e técnica, é que a Madeira continua amarrada a um modelo ultrapassado de economia dirigida, onde o sector público reina e o sector privado é um refém. Em vez de fomentar a competitividade, incentivar o empreendedorismo ou reduzir o peso do Estado, os governantes regionais escolhem o caminho fácil: arrecadar mais impostos, gastar mais e culpar o governo central por tudo que corre mal.

Este boletim é, portanto, não apenas um diagnóstico da situação orçamental da Madeira, mas também um monumento à mediocridade da classe política que perpetua este ciclo de dependência e desperdício. É um lembrete de que, no teatro do poder, números grandes e discursos optimistas escondem, quase sempre, uma verdade terrível: o fracasso absoluto da governação.

Dezembro 2024

Nuno Morna



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