Vão votar. Por amor de Deus, vão votar.

Amanhã há eleições. E vocês, que estão cansados, que passam os dias a dizer que isto não muda, que isto está podre, que os políticos são todos iguais, que são todos uns bandidos com gravata, vocês, provavelmente, não vão votar. Ficarão sentados no sofá, os olhos inchados de tédio, os pés sobre a mesinha baixa, a televisão a mastigar-vos devagarinho com vozes de plástico e cores de supermercado.

Não é que votar vá salvar-vos. Não é que, depois do voto, o mundo se transforme, subitamente, num lugar decente, onde não serão enganados todos os dias por senhores com discursos treinados. Mas há um certo gesto. Um gesto pequeno, quase ridículo, de quem diz "ainda cá estou". De quem recusa desaparecer, de quem insiste em existir. Um traço negro num papel sujo, numa sala de uma escola com cheiro a lixívia, e é isso, meus amigos, é isso que vos impede de ser mobília.

Um povo que não vota é um povo que já desistiu. Um povo que se entrega aos outros como quem se deita ao lado de um corpo que não ama. Um povo que aceita. E quem aceita, meus senhores, é comido. Devagar, com cerimónia, com protocolo, mas comido.

Votem, então. Votem como quem se vinga. Votem como quem se recusa a morrer de mansinho. Votem como quem insulta com elegância. Votem no que quiserem, no que vos apetecer, na fúria ou no desespero, ou na última esperança que guardam escondida no fundo de uma gaveta qualquer. Mas votem.

Não pelos partidos. Não pelos políticos. Votem por vós. Por não vos deixar adormecer por esta névoa de promessas, esta espécie de soporífero democrático que vos vendem com um sorriso.

Votem. Se não for por convicção, que seja por raiva. Que seja por vergonha. Que seja por uma espécie de amor cansado à terra onde nasceram.

Votem caramba! Porque isto, isto de cruzar os braços e dizer que nada vale a pena, é o princípio do fim. E já chega de fins.

Março 2025

Nuno Morna



Comentários

Enviar um comentário

Mensagens populares deste blogue

Silêncio Frio: O Funeral Turístico do Ribeiro

O Dia em que o JPP se Demitiu de Santa Cruz.

O cadáver adiado que se recusa a sair de cena.