Monopólio da Banana: a ditadura do proteccionismo em nome do agricultor.
"A competição não é uma questão de preços baixos, mas de melhor servir o consumidor. Onde há concorrência livre, cada produtor precisa de oferecer mais valor para sobreviver." - Ludwig von Mises – Ação Humana (1949)
"A mais perigosa ilusão é acreditar que se pode entregar a um organismo central o controlo de um sector da economia sem comprometer a liberdade e a iniciativa nesse mesmo sector." - Friedrich Hayek – O Caminho para a Servidão (1944)
Pedro Pereira, do CDS, escreveu um artigo no Funchal Notícias onde defende e traça loas à GESBA e ao monopólio da comercialização da banana. O texto em causa é uma daquelas defesas piedosas, e um tanto histéricas, de um sistema que já não convence ninguém, excepto, evidentemente, os que vivem dele. Trata-se da justificação, mais ou menos envergonhada, do velho monopólio da banana na Madeira, como se estivéssemos ainda nos anos oitenta e o mundo lá fora fosse uma ameaça terrível à nossa pureza agrícola. No fundo, é a mesma conversa de sempre: a concorrência é má, a liberdade comercial é perigosa, e só um grande paizinho, benevolente mas autoritário, nos pode proteger da selva lá de fora.
Começa com uma pergunta de catequese económica: “Dois comerciantes lado a lado, qual é o efeito esperado no preço do produto?” E o que se segue é o que já se espera: uma ladainha sobre a guerra de preços, o fim das margens, a miséria dos agricultores. O raciocínio é velho como o marxismo de sacristia: se houver mais do que um vendedor, todos se matam uns aos outros, os preços caem, os produtores passam fome, e os supermercados, esses ogres modernos, levam tudo. A concorrência, segundo quem assim pensa, é um mal absoluto, uma degenerescência que deve ser extirpada como um cancro. Tudo isto, claro, dito com o ar muito sério de quem está a explicar aos ignorantes como funciona o mundo.
Depois vem a denúncia habitual: “Dois ou três compradores fazem 60 a 70% das compras.” Uma tragédia. Um apocalipse. Só que, curiosamente, a solução proposta não é diversificar os compradores, melhorar o produto, criar canais alternativos de venda ou, Deus nos livre, exportar. Não. A solução é criar do outro lado um monstro igual, um monopólio do vendedor. Um cartel oficializado, ungido, abençoado pelo governo regional ou por qualquer organismo com sigla pomposa e ar de respeitabilidade. Em vez de resolver o problema, duplica-se. Em vez de abrir o mercado, fecha-se. E tudo em nome do pequeno produtor, que no fim, ironia das ironias, continua na mesma: pobre, tutelado, dependente da esmola pública.
O texto continua com uma acusação extraordinária: “Se houver várias cooperativas a concorrer entre si, o preço vai continuar a descer.” E até se pode acrescentar uma outra, esta da minha lavra: "se houver mais do que uma entidade a comercializar concorrendo entre si, o preço vai continuar a descer". Estás frases, que num país normal provocariam risos, podem ser aqui ditas com uma solenidade burocrática. Não se admite, nem por um segundo, que estas cooperativas, ou empresas, pudessem diferenciar-se pela qualidade, pela eficiência, pela inovação. Não. São todas iguais, vendem todas “a mesma banana”, ao mesmo comprador, ao mesmo preço, com o mesmo resultado. E como não sabem competir, querem que o Estado, ou o primo do Estado, acabe com a brincadeira e imponha uma ordem natural nas coisas. É o velho sonho português do mercado sem mercado, da economia sem risco, da iniciativa sem responsabilidade.
Mas o momento mais revelador chega com a defesa do monopólio da banana. Sim, o monopólio. Aquela coisa que em qualquer outro sector seria considerada ilegal, nociva, lesiva do interesse público. Aqui, na Madeira, é tratado como um acto de sabedoria ancestral. “A ideia foi aumentar a força negocial.” Claro. Porque só com um canal único é que se consegue negociar melhor com os retalhistas. Como se estes fossem uns tontos que aceitam o que lhes impõem. Como se o poder de mercado se criasse por decreto. Como se pagar mais ao agricultor dependesse apenas de impedir os outros de vender. É uma lógica de caserna, mas servida como se fosse uma estratégia de Harvard.
O que ali vai é puro intervencionismo estatal, demonstrativo de quem defende um mercado onde ninguém possa fazer nada que não esteja previamente autorizado pelo todo poderoso Estado. Onde a banana deve obedecer a um regulamento como se fosse uma peça de maquinaria pesada. E onde quem se desviar do protocolo, por mínima que seja a infração, leva com o peso da autoridade. Esta fixação no controlo revela exactamente o que o sistema é: frágil, medroso e fundamentalmente desconfiado das pessoas.
O retrato final é triste, mas familiar. Um sector fechado, burocrático, sem imaginação, sem autonomia. Um sector em que a sobrevivência depende de protecções legais, de subsídios europeus, de favores políticos. E onde tudo é feito em nome de um produtor que nunca decide nada, nunca arrisca nada, nunca pode escolher outra via. O resultado? Ausência de estratégia de exportação. Produto indiferenciado. Dependência crónica. E uma economia agrária que vive como se ainda estivesse no tempo do senhor engenheiro agrónomo com bigode e pasta de cabedal.
Há alternativas. Mas são perigosas. Exigem abertura. Exigem risco. Exigem que se acabe com o monopólio e se deixe o mercado respirar. Que se permita a entrada de operadores novos, com ideias novas. Que se crie valor onde hoje só há embalagem. Que se venda directamente ao consumidor, sem intermediários paquidérmicos. Que se aposte na transformação do produto, na marca, na diferenciação. Que se exporte, finalmente, para mercados que queiram pagar mais por uma banana que não é igual a todas as outras.
Mas tudo isso é demasiado ousado. E, como sempre em Portugal, e especialmente na Madeira, ousar é suspeito. É mais seguro manter o velho monopólio, fingir que tudo está bem, e continuar a dizer que se protege o agricultor. Mesmo que ele continue na miséria.
Maio 2025
Nuno Morna
PS.: o Sr. Secretário de Agricultura e Pescas fez uma festa com a banana no Debate do Programa de Governo. Que em 2024 tinham sido distribuídos 25.000.000€ por cerca de 2900 bananicultores. A ser assim, vamos a contas:
25.000.000 a dividir por 2900
- 8.620,69 € por ano
- 718,39 € por mês
- 23,62 € por dia
Isto assumindo uma distribuição equitativa, o que na realidade não acontece. Há deles a receber muito mais, porque produzem mais, e outros muito menos, porque produzem menos.
Uma verdadeira fortuna que faz dos nossos bananicultores pessoas que só podem olhar para a sua actividade como um part-time... ou um trabalho com um rendimento miserável, que nem chega a um ordenado mínimo em vigor.
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