Três euros por cabeça, 351 mil euros depois, e os trilhos continuam iguais... se é que não estão piores.

O Instituto das Florestas e Conservação da Natureza, esse nome que devia ser uma promessa, uma promessa de verde, de limpeza, de ordem, de cuidado, de responsabilidade, de qualquer coisa que tenha a ver com árvores, com passarinhos, com turistas de mochila e garrafa de alumínio, arrecadou, dizem eles, trezentos e cinquenta e um mil euros com a tal taxa, a tal taxa de resíduos, entre Outubro e Dezembro, sim, só três meses, e só sete trilhos pagos nesse tempo, e agora são trinta e oito, e agora todos pagam, menos os residentes, coitados dos residentes que pagam noutras moedas, menos óbvias, mais longas, mais resignadas.

Três euros por cabeça, três euros vezes milhares, e agora o dinheiro existe, dizem que existe, dizem que foi cobrado, dizem que entrou, mas ninguém sabe onde está, ninguém viu nada, ninguém cheirou nem um cêntimo a mais nos caminhos, nos trilhos, nos atalhos, nos barrancos, nas pedras soltas que torcem tornozelos, nas placas ilegíveis, nos guardas que não existem, nos avisos que não avisam, nas veredas que continuam como estavam ou talvez um pouco piores, porque o tempo não perdoa e a erosão é mais persistente do que os comunicados do governo.

E a pergunta, a pergunta que ninguém faz alto mas que toda a gente pensa baixo, a pergunta que fica no ar como um mosquito a zunir perto do ouvido, a pergunta que se esconde atrás do papel timbrado e dos discursos com vocabulário de técnico médio: onde está o dinheiro? Onde foi posto? Onde foi gasto? Onde foi enterrado? E se foi gasto, foi gasto em quê? E se foi enterrado, foi enterrado com quem?

Havia de servir, dizem, para manter os trilhos, para limpar os trilhos, para vigiar os trilhos, para cuidar dos trilhos, mas os trilhos, os pobres trilhos, continuam a mesma coisa de sempre, a mesma coisa de há anos, a mesma coisa de antes da taxa e provavelmente a mesma coisa depois da taxa, e se alguém foi contratado ninguém deu por ele, e se alguma coisa foi feita não foi feita onde se vê.

Uma taxa, disseram, uma taxa para ajudar, uma taxa para melhorar, uma taxa para proteger, e esqueceram-se, ou fingiram que se esqueceram, ou esperavam que nós nos esquecêssemos, que uma taxa, para ser taxa, tem de dar alguma coisa em troca, tem de devolver, tem de compensar, tem de se justificar, tem de ter rosto, tem de ter corpo, tem de ter consequências. Quando não dá, quando não devolve, quando não aparece, quando desaparece no nevoeiro da burocracia e no silêncio do costume, então não é taxa, é imposto, e dos maus, dos feios, dos que se disfarçam para parecer outra coisa.

E se não há obra, se não há prova, se não há mudança, se não há limpeza, se não há sinal, se não há voz, que ao menos nos deem um plano, um desenho, uma maquete, um esboço mal feito num guardanapo sujo, uma linha no papel que diga aqui vamos fazer isto, aqui vamos melhorar aquilo, aqui vai nascer qualquer coisa que valha os três euros por cabeça. Mas o que há, por enquanto, é silêncio. E o silêncio, na Madeira, nunca é vazio, é sempre cheio de qualquer coisa. Cheio de pressa, cheio de pressões, cheio de pequenos arranjos, cheio de nomes que se repetem nos gabinetes. Cheio do que já sabemos mas não dizemos. Cheio daquilo que se sente antes de se ver. Cheio do que é nosso, e não devia ser. Cheiro mau.

Abril 2025

Nuno Morna



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