Empresas como espelhos embaciados.

[Quatro milhões para se dizer que se fez. Meio cêntimo por dia para calar a vergonha] O programa CRIEE, disseram com a solenidade de quem anuncia a descoberta do mar ou o nascimento de uma ilha nova ao largo da Ponta de São Lourenço, criou 570 empresas e 959 postos de trabalho desde 2015, e eu a imaginar os homens das fotografias com os papéis na mão e os olhos semicerrados do costume, como se tivessem acabado de inaugurar a liberdade ou pelo menos uma estrada, e por baixo os sorrisos de catálogo institucional que se repetem há tantos anos que parecem já vir colados às caras como aqueles óculos que os velhos não tiram nem para dormir. Cinco centenas e setenta de empresas, disseram, como se fosse coisa que tivesse peso ou substância, cinquenta e quatro por ano, uma por semana, uma por cada sete dias que passam sem que ninguém se lembre de perguntar o que foi feito das que vieram antes, das outras, das que já não estão, das que nunca chegaram a estar, das que nasceram para morrer no temp...